VOZES DA MINHA CABEÇA #3 O hype mais atrapalha do que ajuda?
Arcane é realmente tudo aquilo que me falaram. Diferentemente, falaram até demais da cena do Trap Br.
Confesso que infelizmente sou aquele tipo de pessoa que perde interesse por certo artista ou obra se está muito hypada. No caso, me refiro a algo que não consumi ainda mas que queria (não sou tão doente assim). Odeio essa sensação mas ela acontece frequentemente. Quantas séries saíram da minha lista porque as pessoas falaram demais. Algumas ainda acho que nunca irei dar play como Dahmer, também pelo fato de odiar a espetacularização do true crime. Não à toa também resisti a assistir a temporada dos Irmãos Menendez (que comecei mas ainda não acabei e talvez nem vá). Outras estão no aguardo do play mas ele vai acontecer algum dia. Como é o caso da que vou falar hoje.
Arcane foi aclamada pra caramba quando saiu, todo mundo falava bem, meus amigos que jogavam LOL falaram bem, os que não jogavam também mas mesmo assim não senti vontade de ver em meio aquele hype todo. Agora cá estou, perto da estreia da temporada final da série e simplesmente ainda sem acreditar que demorei tanto tempo pra ver isso. Todo o alvoroço em volta da série é justificado. Me questiono até por onde começar de tantas coisas boas que tenho para falar mas vamos por partes.
Primeiro impossível não falar sobre a construção de mundo que era de se esperar com uma lore tão grande quanto a do League of Legends. Meu sonho que a Blizzard venda os direitos de Overwatch e alguém faça uma adaptação desse nível porque ali tem um tesouro escondido. Mas voltando, gosto como a série utiliza de personagens existentes mas não se prende a eles. A construção tá ali pra fazer sentido para a série e não pra ser fã-service de jogo. Os personagens nos cativam do início ao fim. Até mesmo aqueles que pareciam ser mais rasos que um pires - Viktor tu é chatão mano - conseguem ter um background foda.
A estruturação dos episódios e dos atos da temporada completa brilham muito para mim. Todos os episódios se complementam mas os arcos individuais (a cada 3 ep) tem muito a dizer sozinhos. Você assiste um, depois assiste outro porque 2 é um bom número, então fala só mais um para chegar na conclusão do ato e não conseguir parar de assistir. Esse aqui foi um dos únicos momentos em que a rejeição da Netflix ao semanal e a separação da temporada em partes fez sentido. E olha que eu sou um defensor assíduo do formato semanal.
Gosto também como a série não cai na bobeira de ser Piltover x Zaun. Os personagens inicialmente estão preocupados em lidar com as merdas de sua própria cidade do que com os problemas dos vizinhos. E nisso também se torna interessante como eles não disputam um recurso específico que é responsável por tudo. Porque se existe uma narrativa comum é essa de domínio de um único recurso e um tem que roubar do outro. A Hextec e Cintila são construídas uma independente da outra para que uma possa destruir a outra, ou conquistá-la. Sua junção é basicamente um Megazord que nem os próprios personagens entendem como funciona, tanto que Jinx e Viktor demoram a descobrir o que poderiam fazer. E quando descobrem, saem do controle.
Tudo isso me fez cair rapidamente no gosto da série mas pra mim o destaque máximo, que de longe foi a melhor coisa da produção é a Jinx. Aquela cena de introdução dela no navio, meu amigo, de arrepiar. A personagem vai se mostrando cada vez mais caótica mas ainda com o medo e insegurança que a Powder carrega. Gosto como suas alucinações com seus amigos mortos são usadas de maneira sútil e precisa, mostrando como apesar de falar com eles, ela é quem está no “controle”. Não tem coisa pior do que ver alucinações com grandes diálogos expositivos como se o público fosse burro e existisse a necessidade de deixar claro o que ocorre na mente de um lunático. Isso é uma das piores coisas na quarta temporada de The Boys onde o Butcher tá 100% do tempo falando com o cara que a gente tem certeza que está na cabeça dele mas a série acha seu mistério superinteligente.
Até no momento final, em que o personagem perde o controle, a animação faz melhor que a série do Prime Video. Enquanto Joe senta no banco de traz do carro de Butcher, mostrando com quem está no comando, Jinx se transforma em uma só com sua loucura. Não a toa, perdemos “acesso” a sua mente. A personagem deixa de falar com fantasmas e faz escolhas mais acertadas. Não porque ela se recuperou e sim porque ela chegou em um estágio de insanidade absoluta. Powder e seus ressentimentos já não tem lugar naquele corpo.
Sinto que em meio a tantas coisas boas, a série se perde um pouco na história de Viktor. Sua doença culmina em experiências perigosas mas como ele esta sempre sozinho, essa parte se torna quase irrelevante para história. Somente quando ele procura seu mentor as coisas começam a andar mas não existe mais tempo para desenvolvimento. Espero que façam melhores escolhas para o personagem na parte final.
Por enquanto seguimos com um saldo muito positivo da série e espero que a segunda e última temporada mantenha o nível. Graças a deus só tenho que esperar uma semana e não 3 anos.
Falando em hype, nesse último mês o Vulgo FK fez uma divulgação interessantíssima pro seu novo álbum: F**K SONGS. Os conteúdos conscientizando o público a usar preservativo com os seus amigos de convidados carregavam não só a ideia do projeto como a personalidade de cada um dos seus colegas. Apesar da criatividade na promoção, algumas pessoas não ficaram felizes com o resultado. E ai surge a discussão sobre a presença das mesmas pessoas (feats e produtores) em todo álbum do cenário trap atual. Gosto de pensar esse cenário por algumas possibilidades que tem muito a ver com o movimento do RAP.
Pra começar com algo que é óbvio mas parece que alguém sempre tem que criticar: desde quando a produção pertencer as mesmas pessoas é um demérito?? O @meudeusvey citou o Pharrell nos anos 2000s mas nem preciso ir muito longe. O Douglas Moda assina 70% da produção musical do pop hoje, o Iuri Rio Branco esta cada vez presente em várias cenas, o Ruxell e o Pablo Bispo ainda fazem barulho (principalmente com a Gloria Groove). A basicamente dupla Billie Eilish (porque só existe o que existe por causa da presença do Finneas). Em toda a cena ta regado de gente que produz a maioria das músicas mas por algum motivo isso é um problema aqui. Sendo no trap é um dos poucos espaços que os produtores são creditados como deveriam: artistas que colaboraram na faixa com seu nome lá, sem a necessidade de se procurar os créditos da música para ver quem fez o beat.
E tudo isso é consequência de uma coisa que o movimento rap proporciona: a união. Os cara tão sempre juntos, apoiam os trabalhos um dos outros, fazendo shows juntos e curtindo. Porque se negar a trabalhar junto? E querendo ou não, muitas parcerias são sucesso, principalmente no tiktok, então serão repetidas. Afinal, os cara tão ali pra sobreviver né. Eles começaram tendo que correr por migalhas e agora não vão parar porque se fala mal.
Particularmente eu entendo o porquê de ocorre mas acho que na questão dos feats a crítica é muito válida. Podem lançar single junto e pah mas quando é hora de fazer um projeto, um álbum, é hora de sair da caixa. Um álbum, na minha visão, não pode ser carregado por outras pessoas, sua visão é a principal ali. Não falo que precisa ser solo (porque também odeio essa ideia de que feat é coisa pra se escorar) mas muitas vozes - mesmo que sejam minoritárias - atrapalham a mensagem principal. Acho que é algo em que a 30PRAUM acerta muito. Os 4 membros tão muito presente na cena com diversos artistas mas seus projetos são orientados pela sua visão, sozinha. E as vezes também é necessário sair da caixa, buscar artistas em outras áreas porque no final a música ta pra favorecer a música e é isso. Não à toa que pra mim o ponto alto do álbum do FK é o feat com a Carol Biazin. Uma movimentação fora do comum gera uma parceria ou até mesmo uma amizade que tira o outro da zona de conforto quando precisa ir a um novo estilo. Esse networking é muito foda de se ver, principalmente para quem assim como eu acompanha diversas cenas da música.
E veja bem, estou falando de álbum. Mixtape, que por agora ta rolando muito de gravadora, como o BK fez com Verão Criminoso e a Supernova vai fazer, são coisas lindas de se apreciar porque o número de artistas é o que faz aquilo. Mas é outra situação. No quesito álbuns, entendo totalmente como esse movimento mostra a essência do rap, da união mas acho que existem malefícios nele e maneiras de se contornar. Afinal se tem uma coisa que esses caras tem são contatos.
Pra finalizar, vamos falar de mais uma temporada de Only Murders in the Building finalizada lindamente. Steve Martin, Martin Short e Selena Gomez continuam entregando carisma e a história continua envolvente. Toda a trajetória da Sazz é foda de ver e o episódio final é reconfortante. Ótimo ver como a “gangue” deles aumenta cada vez mais mas no final do dia são os 3 pelos 3. Apesar de reconfortante, o episódio é fraco. Antes de ver o final estava lembrando do episódio da primeira temporada: “The Boy from 6B”. Porra, que episódio foda! Um dos melhores dos últimos anos. E é uma coisa que tenho certeza que Only Murders não vai mais fazer. A série continua legal mas até que ponto vale se estender se eles não vão mais se desafiar. Cada ano que passa vejo menos sentido nas indicações da série ao Emmy e pra mim ela não tem mais esse lugar. Agora, obviamente com um gancho já puxado, espero que eles terminem na quinta temporada ou se desafiem mais no próximo ano.
No delivery da semana:
Estranhamente, as indicações da semana tem mais a ver com nostalgia com os lançamentos (que vão estar fortes na próxima edição). Muito disso porque ainda estou vendo ou acabei de começar a consumir os lançamentos. Hoje (28) saiu o Chromakopia do Tyler (que já está crescendo pra mim), ainda vou ver o especial da Olivia pra Netflix, São Paulo - do The Weeknd e da Anitta - ta pra sair já e estou enrolando mas pretendo ver A Substância. Então em algum momento vou ocupá-los com coisas novas mas por enquanto é isso! Até a próxima edição!
Filme: A visita (tem no Prime) - Gosto de como o Shyamalan traz o terror sobrenatural e consegue deixá-lo mundano e comum ao final. Nunca pensei que a velhice fosse dar medo mas esse filme provou que isso não é impossível. Lembrava um pouco do que acontecia mas o final ainda sim me surpreendeu. E o uso do notebook aqui, lindo demais.
Série: Shrinking (Apple TV+) - Estarei nas trincheiras espalhando a palavra dessa série que aquece o coração. Terapeutas fudidos e tendo que resolver suas vidas e a de seus pacientes, também fudidos, que delícia. Todo o elenco é muito bom mas não tem como não falar do Jason Segel e do Harrison Ford (que está atuando melhor que em muito filme dele). A primeira temporada é perfeitinha e a segunda está em exibição e mantendo a qualidade de antes.
Álbum: Graduation (Kanye West) - Eu sou uma das pessoas mais céticas quando se fala sobre a influência do Ye e de como independente de qualquer coisa ele tem que ser respeitado na música. Ainda aprendo a lidar com o separar o artista da obra. Mas ouvir isso aqui e não falar que é bom é loucura. Melhor que 100% do que já ouvi dele (que foi do Donda pra frente). Você com certeza conhece 5 músicas do disco. E eu ainda me impressiono que o cara meteu o Chris Martin e mandou uma pedrada. Aqui eu tive que aceitar.
Conteúdo aleatório: Essa semana temos um belíssimo texto escrito pelo grande Filipe vulgo @seriadator no Twitter que além de fazer grande ótimas listas sobre séries, fala aqui do formato semanal de lançamento e como ele é melhor que a maratona de temporadas que a Netflix popularizou.
Análise | Uma defesa do formato semanal e o porquê de ele ser o melhor para séries